30.6.05

Gay parade, violencia e 45 dias faltando
In light of the violence we have
seen here today, it goes to show how
much farther we have to go to turn
Israel into a liberal and tolerant state.

Hoje foi dia da primeira parada gay aqui em Jerusalem, cuja realizacao acabou aprovada apesar das manifestacoes dos ortodoxos. Deu merda, claro. Um tipo de preto esfaqueou gente no meio da passeata colorida. Uns foram presos, outros foram internados. A frase acima, do deputado Roman Bronfman, resume o espirito dos dias de hoje em Israel. Existe uma tensao muito, muito forte no ar.

A caminho do trabalho, onde estou agora, o onibus precisou desviar do roteiro. Ficamos, la dentro, entre reclamacoes de uns e de outros, sem saber a razao. Podia ser chefetz chashud, objeto suspeito que atrai a atencao da policia, coloca robos e sistemas avancados de detonacao controlada em acao. Podia ser um agente laranja ou um monte deles fazendo uma manifestacao contra a saida da Faixa de Gaza. Podia ser um acidente, ate...

A coisa esta' feia, mesmo. A violencia entre judeus estampada na capa de jornais, circulando na internet. Frases de efeito, slogans dos dois lados (hoje eu ouvi a versao de resposta ao "judeu nao expulsa judeu": "judeu nao expulsa judeu, apenas o move um pouquinho"), faixas cor-de-laranja e azuis (consegui a minha hoje, afinal) penduradas pela cidade, nos carros, nas mochilas, nos pulsos e nos postes...

E o medo do que vai acontecer em 45 dias, que e' so o que falta para a desconexao. Tao pouco tempo faltando, hoje o Exercito decidiu declarar Gaza territorio fechado - ninguem entra, quem quiser sair faz um favor. A duvida e' o que mais assusta. Os confrontos estao por toda parte, nao apenas la em Gaza. No mesmo onibus, hoje, um tipo gritava e brigava com um outro, como se fosse coisa pessoal: cada um tinha no pulso uma cor diferente...

29.6.05

Coisas de idioma
Já deu um fora enorme com idioma? Eu já dei um monte deles. Se fosse tentar lembrar, certamente deixaria diversos foras de fora. Eis que hoje quis comprar uma fita azul (como a cor-de-laranja que está na moda aqui) para fazer oposição aos que fazem oposição ao plano de saída de Faixa de Gaza, chegando.

"Fita" em hebraico é seret, a mesma palavra para "filme". E seret cachol, eu não sabia, é uma forma de se referir a filme pornô... Pois eu entrei em uma loja, de brasileiros pra deixar o fora ainda mais... fora, e pedi, pronunciando com todas as letras seret cachol. O cara riu, claro. E pergutou se eu queria seret cachol de banot, garotas. Não entendi, claro.

Fora dado e sem a fita azul, saí da loja e fui comprar meu primeiro eletrodoméstico, para encarar o verão que ainda nem chegou (mas já está derretendo nervos), um ventilador. Acabei de montar e de instalar em uma tomada roubada do despertador - refrescar é preciso, acordar não é preciso.

E agora, vento na nuca, ouvindo um pouco de músicas variadas e um tal de Damien Rice, penso na boa fase que vou levando. Mesmo com a decisão de adiar os estudos, porque existem coisas mais urgentes na vida nova. E enquanto viajo nos pensamentos passeio por São Paulo, minha cidade da nostalgia. E penso nas pessoas que de repente me avisaram que vêm para cá...

24.6.05

Mãe, esse bicho bobo!
Cena de ontem: a mãe, nova, não mais de 30 anos, sobe no ônibus com o carrinho da filha, novinha, alguns meses apenas. Pede ajuda (a minha ajuda) para segurar o carrinho enquanto vai até o motorista pagar a passagem. Volta, agradece. E passa a cuidar do movimento do carrinho em cada curva, em cada vez que o ônibus freia bruscamente, em cada aceleração exagerada.

Ela dá água para a bebê, que parecia ter sede. E aí, entre um e outro gole, agachada diante do carrinho e com os olhos brilhando com os olhos da criança, ela começa a beijar os pezinhos, a mão pequenininha, faz carinho no cabelo e no braço da menina, tão carente e tão entregue ao amor e aos cuidados da mãe. E a mãe deslumbrada, ainda. Ainda e sempre, para sempre.

Não tem nada como amor de mãe. Saudade da minha.

21.6.05

Histórias de ônibus
O sistema de transporte em Israel até que é bem eficiente. O tamanho reduzido do país e das distâncias ajuda, sem dúvida. Os passageiros é que por aqui não são muito eficientes. A entrada no ônibus pode ser uma briga de cotovelos que pode durar até quinze minutos em um parada em horário de pico.

Como ontem. Entrei no ônibus, falafel numa mão e cartão chofshi chodshi na outra, em meio a um monte de gente. Logo na primeira fileira uma velha de pé brigava com um velho sentado que, não acreditei, não concordou em deixá-la sentar na cadeira ao lado, que ele usava para acomodar o carrinho de feira vazio e dobrado.

Num determinado momento, sem desistir da idéia de sentar ali, a velha disse num tom tão didático que humilhou o velho: "isso é transporte público, serve para ortodoxos, laicos, árabes, pra todo mundo... Se você quer conforto, vá pegar um táxi". Deu vontade de aplaudir a velhinha, mas aprendi que aqui não vale a pena comprar briga dos outros. Até porque ela ganhou a parada e sentou lá.

Hoje outra cena memorável. Indo para o jornal reparei na menina que fazia a segurança da parada(*) - ela mesma de parar o trânsito, linda, linda. Em geral esses seguranças abordam os suspeitos para tentar ouvir um sotaque árabe demais ou descobrir algo que os menos atentos deixam passar. Pois bem, a menina abordou um sujeito (que até eu, leigo, dei por suspeito) e o cara fingia que não era com ele...

Dessa vez deu vontade de comprar a briga, mas não me esqueci da lição aprendida. Fiquei na minha. O ônibus 8, o meu, chegou e o cara subiu. Eu deixei passar. Aproveitei para puxar papo com a segurança, dizendo como o sujeito tinha sido ousado. Ela, seca, respondeu que faltou educação em casa. Concordei e vi na feição dela a preocupação por ter deixado o cara tomar o oito.

E enquanto esperava o outro 8, que demorou, ia dando meu lugar no banco do ponto para um velhinho quando ele disse: "fica, meu filho, tem lugar para todo o povo aqui", usando a palavra hebraica "am". Foi a frase do dia! Dei risada, sentando de volta ao lado dele, e ele retribuiu. Histórias de ônibus...

Glossário
Chofshi chodshi, que literalmente signfica "mensal livre", é o nome do cartão que se compra mensalmente para andar livremente de ônibus. É mais ou menos como ser o personagem de Carne Trêmula, de Almodovar, mas com a necessidade de renovar o direito mediante pagamento a cada trinta dias, em média!

(*) As principais e mais movimentadas paradas de ônibus em Israel têm seguranças vestidos com um unforme transado e - sempre - óculos escuros. A idéia é não deixar um indivíduo suspeito tomar o ônibus. Mas na verdade o efeito é muito mais psicológico (a população fica tranqüila ao saber que vai sendo cuidada) do que prático.

20.6.05

No ar
Para quem nao sabe, estou trabalhando ha dois meses e meio, mais ou menos, no Jerusalem Post, o maior jornal em lingua inglesa de Israel (pelo menos o unico so em ingles). Estou em um projeto novo, o do Cafe Oleh. Sem mais delongas, a boa nova: we're up! Clica no logo e boa diversao!

18.6.05

Zona Franca e pouco estomago
Free Zone foi o filme do Amos Gitai do qual eu mais gostei. Dos que eu vi foi o unico, alias. Quando o entrevistei, anos atras, disse a ele que o considerava um irresponsavel por gerar anti-semitismo por causa do estupro conjugal (como o Estadao escreveu, na epoca) de Kadosh. Free Zone volta a tematica rotineira de Israel e coloca Natalie Portman (judia e israelense, sabiam?) como observadora de um conflito que parece nunca ter fim.

Nao vou contar o filme. O enredo tem menos importancia do que o contexto em que vi o longa. Mais interessante que o filme em si foi ver os israelenses levantando e saindo da sala no meio da projecao - infelizmente, as pessoas aqui nao tem estomago para o assunto - talvez porque ele faz parte da vida de uma forma tao intensa e direta; talvez porque simplesmente qualquer tentativa de retrata-lo no cinema soe muito artificial.

Gitai acertou, finalmente. Vale a pena ver.
ARRUMO OS ACENTOS DEPOIS
Aventura na Africa
A ideia de viajar para o Egito surgiu algumas semanas antes e o tempo passou tao rapido que quando o Carlinhos me disse que ia ser no fim de semana seguinte, nao acreditei. Mas foi. E fomos sem lenco, mas com documento - os passaportes israelenses, para poder sair, e os brasileiros, para poder entrar no Egito sem enchecao. Fomos tambem sem guia - e o que rolou na viagem de quatro dias no norte do continente africano nao foi planejado nos minimos detalhes. Ainda bem. Mochila nas costas e umas ideias na cabeca.

A mochila, a minha mochila, merece um paragrafo so para ela. Meus tres companheiros de viagem - o mineiro Carlinhos e os pauistas Daniel e Fabio - tinham esquecido de um pequeno detalhe: me avisar o horario da viagem, na manha daquela sexta-feira. Fui descobrir as duas da manha, no meio do trabalho, que sairiamos da estacao central de Jerusalem as sete. Eu saio do telemarketing as seis e minha mochila nao estava pronta! Correria e dois taxis a 68 shekels resolveram o problema...

Tudo certo, o embarcar. E ai comecou a aventura - a de voltar para o pais de onde sairam, expulsos, meus avos com meu pai e minha tia antes de completarem dez anos de idade no fim dos anos 1950. E a de percorrer um pedaco da historia que antes so nos livros, nas fotos, na internet. O Egito e' mistico. Mas tambem e' um pedaco do Oriente Medio na sua melhor concepcao - o Oriente Medio do transito caotico, dos pedintes de bakshish (gorjeta), da areia e dos rostos queimados e marcados pelo sol.

Comecamos a viagem no percurso entre Jerusalem e Eilat, trecho de quatro horas e meia com ar condicionado e conforto que nao teriamos nos proximos dias. Logo ao chegar em Eilat, no extremo sul de Israel, fomos para o consulado egipcio carimbar nos passaportes verdes, os brasileiros, o visto de entrada - exigido, no caso de israelense que somos, apenas para quem vai alem do Sinai - e a nossa escolha foi nem parar na peninsula que ja foi de Israel.

De Taba, a fronteira, fomos para o Cairo. Viagem pesada, em uma van apertada, vidros abertos durante as sete horas ate a capital egipcia para compensar o ar condicionado que faltava - e fazia diferenca enquanto cortavamos o deserto. Sete horas depois, comeco da noite, a van parou. E descemos, sem mapa nem ideia de onde estavamos. Os dois anos e meio de aulas de arabe do Carlinhos salvaram nossa vida - um taxi, uma negociacao, e uma viagem demorada ate achar um buraco para descansar os ossos.

Depois de deixar as malas e esconder muito bem tudo que tivesse letras hebraicas estampadas, passear pela cidade. A noite, bem a noite, por volta de onze horas, e' quando as pessoas - muitas pessoas - estao nas ruas. Faz muito calor e e' impossivel ficar dentro de casa. A cena me fez lembrar as temporadas de verao no Guaruja - e as pessoas queimadas e ardendo circulando no calcadao, chinelo esfregando o chao. So que no Egito falam arabe, cruzam as ruas feito loucas e alguem buzina a cada quarto de segundo.

Nao da pra contar tudo de uma vez. Vou fazer isso aos poucos. Depois continuo...

16.6.05

Dá-lhe wireless!
Já sei que estou devendo um post sobre a minha aventura na África, mas antes preciso contar que estou agora com o meu computador no meio da Ben Yehuda, a principal rua de Jerusalém, conectado com wireless, tomando um chocolate quente e esperando o horário da aula. Para quem não sabe Jerusalém está quase toda plugada, de graça, na internet! Existem diversos pontos da cidade em que basta abrir o computador, achar a rede (UnwireJer) e pronto! E eu tô num desses hotspots!! Muito louco! Pena que não trouxe a webcam - mas tive uma idéia - fazer um bate-papo com quem quiser num dia combinado e com câmera no meio de Jerusalém. Assim quem não conhece pode espiar um pouco da rotina maluca e adorável da capital israelense e quem conhece pode matar saudade! Sugestões de dia?!

11.6.05

Do Cairo
Estou no Cairo, Egito, escrevendo rapidamente de um cyber. Esta' tudo bem, ja' estivemos nas piramides (muitas fotos!) e todo mundo diz que eu tenho cara de arabe - ja' virou consenso e piada! 'A noite vamos pra Luxor, ao sul, e devemos seguir amanha para Alexandria, no norte. Muitas impressoes do pais do meu pai e dos meus avos. E a frustracao por nao poder dizer a cada um que ve um "que" de arabe nos meus tracos que eu tenho mesmo um pe aqui.

A cidade e' uma bagunca. Gente atravessando as ruas no meio dos carros em movimento, sinfonia de buzinas, uma zona. Pela primeira vez eu me sinto no Oriente Medio estando no Oriente Medio! Nem a Jordania deixou essa impressao. Tenho muito para contar mas ainda tem muito para ver. Entao vou deixar meus leitores curiosos por enquanto e trazer minhas impressoes quando estiver de novo "em casa". Merda esse negocio de precisar ficar escondendo a identidade!

1.6.05

Ai...
Me dê um abraço
Venha me apertar
Tô chegando
Coisa que gosto é poder partir sem ter planos
Melhor ainda é poder voltar quando quero
Todos os dias é um vai e vém
A vida se repete na estação
Tem gente que chega pra ficar
Tem gente que vai pra nunca mais
Tem gente que vem e quer voltar
Tem gente que vai e quer ficar
Tem gente que veio só olhar
Tem gente a sorrir e a chorar
E assim chegar e partir
São só dois lados da mesma viagem
O trem que chega é o mesmo trem da partida
A hora do encontro é também despedida
A plataforma dessa estação é a vida desse meu lugar
É a vida desse meu lugar, é a vida...


Tem horas que com tanto pra dizer, é melhor calar. Não sei o que contar, as coisas vão como vão. Menos feliz do que eu gostaria, é verdade. Bem menos. Com a sensação de estar jogando no lixo tudo que eu deveria estar aproveitando. Com a sensação de estar sendo jogado no lixo. Mais magro, todo mundo comenta. E cansado - já estou até cansado de dizer que estou cansado. E aí boto a Maria Rita pra cantar no meu iTunes e ela me diz tudo isso aí. Vontade de voltar, eu confesso. Não pra desistir, mas para estar em casa, com as pessoas que eu amo. E nem a mínima condição disso agora. Vou levando a vida. Empurrando com a barriga. Sendo empurrado pela barriga da vida. Vamos ver até onde vai isso. Desaparecimentos do mundo virtual são previstos, ok?