16.9.05

Manhã de sexta no Muro
Tem coisas que deixamos de fazer ao assumir rotinas. Quando turista, sempre que vinha pra Jerusalém ia antes de qualquer outro lugar para o Kotel, o Muro das Lamentações. Rezar. Pensar na vida. Fotografar. Reparar nas pessoas diferentes que passam. Ia sempre. Duas vezes no mesmo dia, até. E voltava no dia seguinte, apenas para ter estado.

Agora tenho uma vida em Jerusalém. Ônibus, horários, trabalho, agenda cheia, compromissos, contas para pagar. A Cidade Velha ficou deixada de lado, para quando não sobra coisa pra fazer. Virou um pedaço do panorama da cidade, ali no horizonte. Quase esquecido, não fosse sua imponência, com as muralhas de mil anos. O Kotel, lá dentro, lugar para ser visitado em ocasiões especiais, que nunca acontecem.

Pois hoje saí do trabalho - viva as sextas-feiras - e caminhei um bom trecho até a entrada da Cidade Velha. Esperei chegar uma amiga francesa religiosa, e tive tempo de fazer o que mais gosto aqui: observar, observar. Depois, caminhamos pelas ruelas que conheceram personagens importantes até o Kotel. Era bem cedo, as pessoas se reuniam ainda para a reza matinal - até perguntaram se eu queria tomar parte, mas recusei.

E lá no Muro, tefilin enrolado no braço e sobre a cabeça, rezando com a testa encostada na parede mais sagrada do judaísmo, reparei em um pai que trazia uma criança de colo. Ele não falou nada. Apenas se aproximou do Kotel. O bebê, chupeta na boca, estendeu o braço curto e com a mão tocou a pedra. Arrepiante. Saí satisfeito, fez meu dia. E fiquei esperando a minha amiga beata, bem mais observante que eu, ali, entregue à fé.

Enquanto espero
Escrevo uns versos
Depois rasgo
(AC)

Shabat Shalom.

Nenhum comentário: